domingo, 8 de abril de 2012

Apenas um reflexo seu


Crônica:
02/04/2012 - 17:14

“Se você fura fila, se você suborna guarda de trânsito, se você troca seu voto por favores, se você tira vantagem dos outros por se achar mais ‘esperto’, se você recebe um troco a mais e não devolve, se você pra tudo na vida dá um jeitinho… você em nada difere dos políticos corruptos deste país. Eles são apenas um reflexo seu” (facebook.com/foto). A citação é mais uma de tantas manifestações de descontentamento com práticas corruptas; isso é bom. Contudo, associa-se corrupção a políticos, generalizadamente; isso é mau, posto que não se indicam pessoa e fato, mas se acusam os políticos pelo simples fato de políticos serem.
Tenho insistido: políticos são flagrados em atos de corrupção porque o Legislativo e o Executivo são expostos a razoável transparência. Suas ações e contas são públicas e publicadas. Quem queira fazê-lo pode avaliar as atividades do político. Já do Poder Judiciário nada se sabe, e não poucos magistrados têm feito de tudo para que nada se fique sabendo. Como a opacidade é a maior causa de corrupção, suspeito que o Poder mais corrupto é, mesmo, o Judiciário. Bastou a imprensa voltar-lhe um pouco de olhos e já viu muito mais do que tantos crentes na Justiça aceitariam imaginar.
Mas o que quero considerar é o estranho entendimento do povo acerca das causas da corrupção que crassa no País. Penso que não se associa o nosso descaso com as instituições republicanas e o consequente arremedo de república que acabamos tendo ao cabo dessa desconsideração. Ora, república é a expressão formal-legal da prática política. Política, por sua vez, é uma relação complexa de interesses e de poder, sendo – ou devendo ser – o pleito eleitoral o seu momento mais importante.
E quem se interessa por isso? Há farto material disponível mostrando que a maioria liquidante dos brasileiros não sabe, logo após os pleitos, em quem votou. Não sabe e não quer saber. Em verdade, conhece pouquíssimo de assunto público. Pergunte-se, todavia, a qualquer popular sobre qual time de futebol jogou com qual outro em tal ano e quais os escretes, juízes, bandeirinhas, técnicos, reservas, goleadores, faltas, cartões vermelhos e amarelos etc. e se vai obter respostas precisas. E mais ainda sabem sobre as baixas intrigas do “bbb”.
Não é politicamente correto dizer isso, mas sabemos que somos assim. Agora, não há como negar que político eleito é o resultado de uma relação eleitoral. Como a coisa eleitoral é – para muitos políticos tanto quanto para muitos eleitores – um balcão de negócios, o que vem depois vem prenhe de corrupção. Ou seja, uma relação eleitoral corrupta produz um político que tem que pagar eleitores. Para pagar eleitores que cobram pelo voto, o político “rouba” dinheiro público. Não há inocentes nisso e é impossível mudar apenas uma das partes culpadas.
Às vezes não queremos lembrar, mas os jeitos de uma sociedade, sua cultura, não são naturais. O mundo é criação histórica. As coisas são de uma ou de outra maneira conforme encaramos as relações de poder e de interesses estabelecidas, e não se vão mudar por moto próprio; se ficarem diferentes é porque foram mudadas. Há várias “ferramentas” sociais de intervenção na realidade: ong, partido político, associação de moradores, sindicato, entidade profissional, movimentos independentes etc. Tome alguma e faça algo, ou não reclame do abominável político corrupto ser “apenas um reflexo seu”.


LéoRosa



Doutor e Mestre em Direito pela UFSC. Especialista em Administração de Empresas e em Economia. Professor da Unisul. Advogado, Psicólogo e Jornalista.

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