quinta-feira, 13 de dezembro de 2012



Crianças em tratamento de saúde enfrentam dificuldades para conseguir matrícula em 

escola pública

É difícil conceber uma política educacional para esse público já que existe uma visão cultural de que a criança doente não vai à escola. Contudo, tanto as mães ? como a de Gabriel ? quanto os educadores já perceberam os benefícios que a educação associada ao convívio social traz aos pacientes.

Por: Marjorie Ribeiro - APRENDIZ, 05.12.2012

Com 16 anos, Gabriel de Oliveira saiu de Aracaju (SE) para fazer tratamento de câncer em São Paulo. Desde então, mora com a mãe na Casa Ninho (Centro de Apoio à Criança Carente com Câncer), no bairro da Aclimação, que abriga famílias sem recursos financeiros para se manter na cidade. Com muito esforço, conseguiu uma vaga em uma escola da rede pública e hoje, com 17 anos, cursa a 8ª série. “Depois que ele começou a estudar e foi integrado, melhorou até o tratamento de saúde”, revela a mãe do garoto, Maria da Conceição de Oliveira.
Gabriel, entretanto, é uma exceção entre os hospedados nas Casas de Apoio de São Paulo que, em sua maioria, não estão matriculados em uma instituição de ensino da capital paulista. Conforme o levantamento realizado pelo Projeto Cores da Vida, da Associação Cidade Escola Aprendiz, em parceria com a Pfizer, 45% dos jovens em idade escolar para frequentar o Ensino Fundamental e Médio estão matriculados na cidade de origem e 11% deles estão fora do sistema de ensino. A situação da educação infantil é ainda pior: “é quase impossível matricular”, denuncia Rosemary Vicari, professora da classe hospitalar do AC Camargo, um centro de tratamento, ensino e pesquisa em câncer.
Burocracia versus direito à educação
Dentre as principais dificuldades está a de obter uma vaga para o paciente que, a princípio, ficará menos do que um ano em São Paulo. A coordenadora pedagógica da Casa Ninho, Maria José Pinto, relata que as escolas exigem que a matrícula feita na outra cidade seja cancelada, mas isso não é possível porque muitos usuários chegam com a esperança de se tratar e regressar rapidamente – o que nem sempre ocorre. “Há ainda as escolas que não aceitam porque não podem se responsabilizar se as crianças levarem um empurrão e caírem”, revela.
A representante da Diretoria Regional de Ensino (DRE) de Santo Amaro, Maria Lucia Vidal, explica que não é permitido manter vagas em municípios diferentes porque o recurso financeiro é disponibilizado por aluno. Por outro lado, o vice-presidente da UNCME (União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação), Artur Costa Neto, ressalta que o direito à educação é maior e deve sempre prevalecer. “Ficamos presos a uma burocracia e não garantimos esse direito”, critica.
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Benefícios da integração escolar
Para Rosemary é difícil conceber uma política educacional para esse público já que existe uma visão cultural de que a criança doente não vai à escola. Contudo, tanto as mães – como a de Gabriel – quanto os educadores já perceberam os benefícios que a educação associada ao convívio social traz aos pacientes.
De acordo com Elizete Barbosa, coordenadora do Grupo de Assistência ao Tratamento e Hospedagem Infantil (GRATHI), do bairro Jabaquara, a criança passa a entender melhor o que está acontecendo com ela e o tratamento de saúde automaticamente evolui. “Quando ela sai do hospital, são pelo menos cem dias na Casa de Apoio. Nesse período, você percebe que falta algo, porque ela fica desenhando para a gente, demonstrando essa necessidade de aprender”, afirma.
A matrícula em uma instituição formal de ensino requer um trabalho de integração. Segundo Rosemary, muitas vezes o professor só dá um papel para que o aluno fique pintando e não estimula a participação em sala de aula. Gabriel sentiu isso na pele e não queria frequentar a escola no começo. “Mas depois que me senti participando da sala foi muito bom. Quando um professor briga comigo, eu fico até feliz”, relata.
Educação nas Casas de Apoio
O levantamento realizado pelo Cores da Vida concluiu que muitas Casas de Apoio de São Paulo não contribuem para a inserção escolar dos seus usuários. Das 18 instituições entrevistadas – do total de 19 – somente quatro têm como política institucional matricular as crianças e adolescentes em escolas regulares ou classes hospitalares. Além disso, 72% delas não desenvolvem um acompanhamento pedagógico sistematizado, sendo que algumas sequer possuem educadores e assistentes sociais na equipe de funcionários.
O estudo mostrou ainda que quatro instituições não estão cadastradas no Conselho Municipal de Assistência Social (COMAS) e cinco não estão inscritas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA). Para Antônio Euzébio Filho, que foi gestor do projeto por dois anos, isso explica a falta de informações sobre as Casas de Apoio e o desconhecimento da sociedade civil e do próprio poder público acerca desta problemática.
Durante três anos, o Cores da Vida ajudou na articulação entre casas de apoio, escolas e secretarias de educação, contribuindo para a efetivação das matrículas de crianças e adolescentes. Além da pesquisa realizada para compreender a demanda educativa dessas associações, na perspectiva do bairro-escola, o projeto que se encerra este ano deixa como legado  um Guia da Educação para a Casa Ninho e outro para o GRATHI.
A publicação reúne um mapeamento das escolas, serviços de saúde e oportunidades culturais e educativas próximas a cada uma das Casas de Apoio; orientações de como fazer a matrícula nas escolas e como obter transporte especial; e uma cartilha com os direitos das crianças e adolescentes hospitalizados. O Guia da Educação nasce de encontros de formação sobre o direito à cidade realizados nas instituições e é ilustrado com desenhos feitos pelos próprios jovens.
fonte; Qua, 12 de Dezembro 2012 - 18:43

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